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Em “Edom”, espetáculo apresentado na Mostra de Dramaturgia do Sesi -Teatro Guaíra no domingo, o dramaturgo e diretor Jean Carlos Sanchez reaviva a parábola bíblica de Esaú e Jacó. O tratado sobre inveja, ardil e perdão num núcleo familiar que viria a originar uma divisão entre povos desenvolve-se em um campo de forças opostas concorrentes, sob o signo da coexistência.
Como uma dobra no fluxo sensível do tempo, o passado mítico do embate entre os irmãos pela benção do pai Isaque encontra o presente do acontecimento teatral. Marca disso são os figurinos usados pelos atores Ade Zanardi, Kauê Persona e Thiago Mique – incluído o indefectível tênis all-star acenando para a realidade contemporânea aos espectadores, como modo de identificação fácil com um estrato social jovem e urbano.
Enquanto o tempo dentro da parábola transita linear, determinado na fala, nos deslocamentos corporais e da luz, o atrito entre texto e imagem faz com que os tempos passado e presente coexistam na encenação. Pretérito que já não é memória, mas simultâneo, modificando a percepção cronológica habitual. Ao romper esteticamente o fio da História, suprime-se então a distância tempo-espacial entre a parábola e o agora, aproximando os atos e afetos.
Sobre um chão coberto de areia, à semelhança das pinturas de Mark Rothko, os irmãos disputam poder às vistas cegas do pai. O traçado de seus movimentos é rigorosamente retilíneo, gestos e vozes depurados contêm-se em modulações precisas. Sobressai na cena um tratamento pictórico altamente estilizado, num ordenamento apolíneo de formas geométricas que se abrem ao vazio.
A abstração geométrica do cenário e da movimentação cênica confronta-se ao figurativismo dos personagens, que cumprem seu destino bíblico sobrepondo o épico ao dramático. Sintetizada em diálogos e narrativas, a parábola preserva os motivos e emoções envolvidos – exceto pela exclusão da participação da mãe e, em certa medida, pela reconciliação final, isenta de justificativas.
Tanto quanto o oscilar entre o épico e o dramático oferece perspectivas distintas do conflito, também a relação com o espectador sofre deslocamentos. Na cena inicial, a título de prelúdio, a luz fecha a imagem no rosto do ator, como um close cinematográfico para um quadro subjetivo. A partir de então, a cena se oferece ao olhar como um quadro. Num terceiro momento, porém, o pai (Adê Zanardini) posiciona a cadeira próxima ao público para narrar-lhe os acontecimentos, abrindo o eixo extracênico a uma relação direta que reforça a conexão temporal com o presente.
O gesto contemporâneo em “Edom” reside mesmo nessa simultaneidade de sensibilidades, na superação temporal, regida por um sentido ético de conciliação.
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